Artigo – Ganância dos bancos mantém juros altos mesmo com Selic baixa

 

Considerando que a Taxa Selic despencou de 14,25% para 6,5% – a maior baixa histórica – e que estamos com a inflação em queda a níveis nunca sentidos nos últimos 24 anos, sendo registrado agora em março um acumulado de 2,68% dos últimos 12 meses, não podemos admitir como sendo, pelo menos, razoável, as atuais taxas praticadas. Essas revelam a enorme ganância do Sistema Financeiro Nacional – SFN em manter as taxas de juros nas alturas. A manutenção dessas taxas pelos bancos só tem contribuído para a descapitalização das empresas, famílias e geração de um contingente de quase 60% da população brasileira endividada.

Agora em março, atropelando os limites da racionalidade, houve registro de novas altas nas taxas do cartão de crédito para 324% e o cheque especial continua com os juros extorsivos e abusivos. Uma verdadeira agiotagem institucionaliza e somente acompanhada pelo Banco Central do Brasil.

Diante de uma distorção tão acentuada e na contramão das sucessivas baixas da Taxa Selic, consideramos como muito tímidas as medidas ensaiadas pelo BACEN até o momento.  Na prática, os poucos reflexos das intervenções do Banco Central sobre as taxas de juros abusivas dos agentes financeiros, só tiveram reflexos efetivos com o fim do crédito rotativo dos cartões de crédito. O Governo está sinalizando indicativos de modificações das cobranças da modalidade para o chegue especial que, após 30 dias de uso por parte dos seus incautos usuários, os débitos dos mesmos migrarão a outras modalidades de empréstimos menos corrosivos, passando-os possivelmente para um parcelamento de crédito pessoal.

E isso causa indignação no parecer do representante dos economistas do Rio Grande do Norte. Uma vez que o Sistema Financeiro Nacional praticamente é o único segmento da economia nacional que não vem passando pelos sacrifícios da crise brasileira que vem se intensificando desde o ano de 2014. Ao contrário, pelos anúncios dos seus balanços, notadamente do setor privado, registram lucros cada vez maiores, de modo óbvio, por meio da manutenção do Spread bancário (diferença entre os juros que o banco cobra ao emprestar e a taxa que ele mesmo paga ao captar dinheiro) elevado.

De forma plausível, o que estamos observando recentemente, tem sido algumas declarações de advertência do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, que funcionam mais como um jogo de cena do que medidas efetivas do Governo Central para coibir tamanha abusividade.

O BACEN agora diz com frequência que está preocupado em aumentar a competitividade no setor bancário, o que nos parece uma ironia, já que os últimos governos, desde a adoção do plano real nos anos 90, assistiram de forma passiva a aquisição dos pequenos e médios bancos cuja sobrevivência se dava graças as cirandas financeiras, fraudes e inflação descontrolada. Com a estabilidade da moeda a partir do plano real, os pequenos e médios bancos, foram engolidos pelos grandes – Banco Bradesco e Banco Itaú, entre outros.

A concentração dos poderes dos maiores bancos passou dos 57%, no ano 2000, para 82% de todos os ativos em financeiro em 2017 nas mãos de cinco grandes grupos financeiros do Brasil. Essa realidade foi assistida passivamente pelo Governo, via órgãos de controle, a exemplo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE.

Nos parece óbvio que, além da ‘gula’ sem limites dos agentes financeiros, os riscos dos empréstimos em alta, os spreads exorbitantes dos bancos, que navegam em mercado pouco concorrido, sejam um dos maiores pretextos dos juros abusivos, porém não justificáveis, mediante de uma queda expressiva e sucessiva que a Selic teve nos últimos meses e que ainda deve despencar para 6,25% na próxima reunião do BACEN.

As únicas baixas a serem comemoradas, embora ainda modestas, foram as registradas no crédito para financiamento de bens duráveis, como veículos e casa própria. Tendo em vista menores riscos devido as garantias reais dos próprios bens financiados.

Principais Taxas Extorsivas

As maiores taxas são as do cheque especial e as do cartão de crédito, especificamente, se a dívida não for liquidada no vencimento e o consumidor passar a rolar essa dívida, essa entra na fábula dos 334%, taxas comparáveis as cobradas na clandestinidade da agiotagem.

Segundo dados do GuiaBolso – plataforma de Finanças Pessoais -, divulgados em janeiro de 2018, 33,22% dos orçamentos familiares são destinados à quitação das despesas mensais feitas com o dinheiro de plástico (cartão de crédito), muito acima dos números recomendados, que não passe de 10%, sendo esse, o vilão do superendividamento das famílias brasileiras.

As boas notícias ficam para as taxas médias de financiamentos imobiliários, situados na faixa dos 11% ao ano – dados de fevereiro do Banco Central. E, igualmente, houve reduções de taxas para as compras de automóveis, que cederam para 22,5%, e está contribuindo à retomada da produção nas fábricas automobilísticas.

Os empréstimos consignados, descontados no contracheque, praticamente com risco zero, e que assim poderiam ser, inclusive mais baixos, custavam, em média, 26% a.a. Para o crédito pessoal (crediários), a taxa não é muito convidativa, estando na casa dos 126%, menor do que as do cartão de crédito e cheque especial. Assim, recomendamos aos que estejam endividados, que façam a migração dessas despesas para um crédito pessoal com urgência. Do lado das empresas estão os recursos destinados para o necessário capital de giro. Em fevereiro, os juros médios ficaram na casa dos 18,7% ao mês; 11,3% para crédito de exportações e 8,1% para o crédito rural.

Diante desse balanço, cabe-nos indagar. Por que tamanha diferença e taxas tão elevadas se a Selic desabou de 14,25% para 6,5% a.a.? Por que tamanha omissão do Governo Temer e do BACEN, se os juros altos travam o crescimento nacional, estimulam o rentismo e corrói a capacidade de pagamento das empresas e das famílias?!

Fazendo uma análise das atuais taxas em prática no mercado, não conseguimos encontrar nenhuma justificativa plausível para o abuso nos juros do cartão de crédito e do chegue especial, tão acima da taxa Selic. Nem mesmo o tão falado discurso de que o risco de calote ainda está elevado, pois mês a mês as taxas de inadimplência estão caindo. Nada comporta e justifica um Spread e taxas de juros tão elevadas do Sistema Financeiro Nacional.

Ressalta-se que os bancos gozam, inclusive, de menos sacrifícios fiscais do que muitos outros setores produtivos nacionais e que geram milhões de empregos, ao contrário da prática do rentismo e da especulação financeira, sendo assim, já basta de tantos privilégios históricos do SFN.

Já passou da hora do Banco Central e do Governo Temer, que se diz reformista, agir sobre a prática da agiotagem e do rentismo exercidas pelos agentes financeiros e seus conglomerados, cuja especulação trava o crescimento nacional, destrói os orçamentos familiares, o das empresas em geral, além de alimentar os elevadíssimos custos da nossa dívida pública.

É nítido que, a exemplo dos muitos segmentos da economia que tem
seus preços administrados – claro que não podemos fazer o mesmo controle com o sistema financeiro -, mas que seja, pelo menos, aberta e controlada a caixa preta dos Spreads dos bancos, esses, verdadeiros celeiros de lucros exorbitantes e gananciosos do SFN.

Cabe-nos, no mínimo, questionarmos se a Taxa Selic é um sinalizador das taxas de juros a ser praticada no mercado, de acordo com as condições macroeconômicas e como eficiente ferramenta de controle monetário da nossa economia. Que essa sirva como referencial para o BACEN criar os limites de intervalos possíveis às práticas de taxas de juros pelos agentes financeiros.

Se o governo Temer julgou oportuno a criação do “teto” dos gastos públicos por 20 anos, por que o BACEN não pode igualmente criar um “teto” do intervalo máximo de percentual a ser aplicado aos juros sobre a nossa Selic?  Se o governo Temer foi capaz de limitar os gastos públicos por 20 anos incluindo gastos da saúde, da educação e da segurança, não pode criar igualmente um “teto” que irá corresponder ao limite de intervalo percentual de rentabilidade dos bancos sobre a taxa Selic e assim controlar, colocar limites e estimular a livre concorrência entre o SFN?

Não controlar a ganância e os ganhos exorbitantes dos agentes financeiros nacional é atestar que o rentismo e a especulação financeira tornem-se mais importantes e prioritários do que promover um ensino público de qualidade e garantir o direito de ir vir de cada cidadão, com segurança. Assim, nada mais justo e racional do que o governo criar o “teto”, limitando o intervalo máximo de cobranças de taxas de juros bancários, tendo como referência a justa Selic.

Por Ricardo Valério Costa Menezes
Presidente do Conselho Regional Economia – CORECON/RN

 

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